quarta-feira, março 11, 2009

Águas de Março

"Traz todo mundo, 'tá liberado, é pra dançar. Traz toda a gente, 'tá convidado, é só chegar, Toda tristeza deixa lá fora; chega pra cá!"

Estava eu a ouvir Marisa Monte quando me apercebi quantas saudades tenho de mim!

Em conversas de café sempre fiz questão de deixar bem claro que de todas as vezes que escrevo "para ti", ponto nº1, escrevo para mim!
"Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são para mim corpos tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas. Talvez porque a sensualidade real não tem para mim interesse de nenhuma espécie - nem sequer mental ou de sonho -, transmudou-se-me o desejo para aquilo que em mim cria ritmos verbais, ou os escuta de outros. Estremeço se dizem bem."

Não nego o que dou de mim ao que escrevo, consigo desenhar-me em palavras, ouvir as minhas próprias gargalhadas, adormecer em água salgada, sou inteira no que faço, entrego ao que me dou. Mas, já dizia o Poeta, que "o Poeta é um fingidor, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente" e tão completamente que o que escrevo não é sobre quem sou, mas para quem sou.

Como estava a dizer, mais que saudades minhas, senti 'saudades de mim!'
Passei demasiado tempo à tua espera, a achar que vinhas. Se demoravas é porque estavas a escolher a minha roupa preferida, mesmo tu sabendo que eu só queria era que viesses e que a tua vontade de chegar fosse maior que os passos que as tuas pernas fossem capazes de dar.
O tempo verbal denuncia tudo..

Há pouco tempo falava de como adormecia com mil e um artigos entre as pestanas, dos preciosos quarenta minutos para ver a minha série preferida, ou de como era ensurdecedor o barulho do despertador com hora marcada junto à secretária. De como dava a vida, fazia dançar os planetas, alinhava o Cosmos para ter uma noite, uma noite que fosse, em que os meus tímpanos ensurdecessem e a manhã me saudasse com um bom dia bem rasgado antes que o sono tomasse conta de mim.
A verdade é que os dias passaram, os artigos foram-se arrumando nas prateleiras e em stand by foram ficando a Constituição do Equador ou a nova lei do divórcio. O dia ganhou de novo vinte e quatro horas, mas são raras as noites que acabam num bom dia bem rasgado e o meu nome é sempre desenhado por uma paisagem de Inverno.

Absorvida por tudo o que nunca fui tranformo-me no reflexo da tua obra. Continuo sentada, à espera que toques à campainha. Consigo imaginar-te com três flores que roubaste do vizinho só para não vires com a mesma cara de sempre e as mãos vazias de nada. Mesmo que nada me chegasse porque era contigo que eu queria estar e não podia ser com mais ninguem.

Não me leves a mal, nunca ousaria falar de ti na minha ortografia. Foste demasiado tudo para ousar fazê-lo. Não saberia sequer aproximar-me dos contornos do teu rosto, tão pouco dar forma e vida ao que me foste.

Às vezes a vida prega-nos partidas e hoje, agora, neste exacto parágrafo com a menor das impessoalidades, fecho os olhos com tanta força só para me lembrar do tal momento em que os meus tímpanos estouravam e o dia seguinte era sempre o melhor de todos!! Lembro-me que já fui assim. Despida de preocupações. Olhos abertos, coração cheio, sem nunca perder! "Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não encontra graça em si mesmo!"
Mas por mais que feche os olhos para não ver a saudade dançar-me à frente ou a mágoa sentar-se ao meu lado, sinto-me sempre como uma criança de quatro anos, com os dedos entreabertos, a fazer batota.
Ainda assim, posso temer sempre o pior, mas acredito sempre no melhor. Rezo todas as noites para que os planos não fiquem a meio e os sonhos pela metade. Embrulhada em alento, vou espreitando sempre pelo canto do olho, de soslaio procuro quem me trouxe até aqui, enquanto devoto as vinte e quatro horas a tentar cronologicamente encadear tantas perguntas sem resposta..
Maldito silêncio!

Diz-me: tambem te doeram os musculos quando tive que ir embora?! As cicatrizes têm o meu nome ou a dor o meu cheiro?! Não te sustive as lágrimas porque estava mais preocupada em conter as minhas?!
Diz-me: ainda tremes quando me vês ao passar?!

Eu digo-te, fiquei sem chão e não tenho por onde andar nem para onde ir. Pensei em ti a noite passada, e a outra tambem.. tentei traçar as linhas para saber se as nossas vidas ainda se cruzam. Perdi a certeza de tudo o que quero, mas tenho a certeza que não quero ser a sombra de nenhum susto no teu caminho. Não me chamo passado mal resolvido!

Aperta-me o peito até não mais respirar de cada vez que vejo a vida passar-me à frente.. Mil e um sonhos com cor, cheiro, nome e residência. Já tenho sítio para morar, já oiço o meu nome do outro lado do Equador, são demasiados planos à minha espera!!
Inspiro e expiro até os pulmões encherem-se de ar, preciso de respirar! A seta está para sul e no sul está o caminho. É para a frente!

Estou farta de introspecções! Fantasmas debaixo da cama! Preciso que saibas o quanto me doeu ver-te partir. Vê, cada nódoa do meu corpo aparece já sem me tocarem. Estou farta de colidir sobre o que não tem solução. Carregar pianos. Não há melhor ou pior maneira de se magoar alguem, magoa-se e pronto!

Só queria que tambem tivessem lutado por mim.
Mas que hoje lutasses por ti!
Que fosses forte o suficiente para ficares aqui. Vais matar uma Família inteira se te fores embora..
Esperei que ficasses do meu lado e que se não ficasses do meu lado, não houvesse outro lado onde quisesses ficar.

Doi-me ver-te partir! Lenta e impiedosamente, mentalizando-me que vais para longe mas nunca mais vou saber onde estás!
Fica comigo, agarra a minha mão, olha para mim. Eu juro que faço dançar os planetas se ficares do meu lado. Não se chama ciclo da vida quando se quer ficar.
É como andar de bicicleta, ainda não tirei as rodinhas de trás.. vês, preciso de ti! Tenho a certeza que vais estar lá para me estender a mão se eu cair. Sempre o fizeste desde que comecei a andar! Fica! Por favor!

Sei que vou sempre sentir-te, como se nunca me tivesses saído do sangue. Afinal é o teu ADN que me corre pelas veias - Grita o teu nome, implora que estejas ao meu lado - Repito, ao meu lado!

Não estou preparada!

Preciso de dois braços, um ombro e um chão!
"Esta noite dança só p'ra mim"

Pedi tantas noites, que era mesmo a última!

1 comentário:

Rita Sem disse...

Revi-me inteiramente nestas magníficas e tão sentidas palavras...

"Absorvida por tudo o que nunca fui tranformo-me no reflexo da tua obra."

Eu própria também "escrevo para mim", "para quem sou"...
Simplesmente lindo...
És linda!
beijinho***