quinta-feira, janeiro 04, 2007

Ela


E naquele momento, num segundo de pura lucidez, sentiu, finalmente, tudo passar-lhe à frente carregado de certezas e a mais pequena vontade de querer aquilo para si.
As mesmas paredes de sempre, o mesmo amarelo e o menor sentido de justiça para consigo e com tudo o que lhe fez acreditar, um dia, que era isso.
As escadas atravessavam-lhe os poros numa áspera sensação de agonia. As linhas rasgavam-lhe a garganta e as letras tremiam-lhe na língua num nojo permanente de um dia ter acreditado que aquele era o futuro.
Os gritos sufocavam-lhe o peito e as mãos agrediam-na numa voracidade compulsiva de quem perdera o mundo vendo-o passar à frente.
Sentia-se a desfazer, evaporando entre as leis que se lhe perpetuavam pelos olhos. Era o pior dia da sua vida ao som de equações imponentes que cortavam os sonhos em bolas de sabão. Esquecera o prazer lá atrás e hoje não se lembrava do que queria.

E enquanto mais um livro corria, mais uma pulsação desmaiava no futuro que o passado esquecera.










(Não era isto que queria. Não era.)

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