quarta-feira, outubro 04, 2006

«Se não fosse o sonhar sempre, o viver num perpétuo alheamento, poderia, de bom grado, chamar-me um realista, isto é, um indivíduo para quem o mundo exterior é uma nação independente. Mas prefiro não me dar nome , ser o que sou com uma certa obscuridade e ter comigo e ter comigo a malícia de me não saber prever.»
Fernando Pessoa


Estou cansada. Infinitamente cansada. Perco-me numa gradual aproximação da inutilidade dos meus dias, mas cada vez mais aborrecidos.
Ainda te tenho a ti, do outro lado da ponte como quem espera a noiva. Os dedos tremem, dizes que é do frio, mas eu sei que é da saudade daquela que procuras em mim atrás das rugas que me fazem perceber o tempo e das olheiras que me consomem as horas. Pelo menos contigo o tempo pára, aquela que me procuras é encontrada entre fios de cetim e o mais belo perfume que te escorre na pele. É a leveza de quem sabe amar. A força que ignora a terra suja e os vidros partidos. As janelas fechadas ou que fazem questão de fechar. É contigo. É contigo que esqueço os olhares deslavados e percebo que antes as olheiras que olhares perdidos entre quem não soube manter o mundo e a individualidade.


Às vezes não sei onde vamos parar. Nem eu sei onde vou parar. Mas às vezes não sei mesmo. Preocupamo-nos mais em ser o alguem que vemos no espelho do lado, que ter alguem que fique com o alguem que vimos no espelho da frente. Procuramos as palavras dos outros para publicarmos o nosso conto, orgulhosos da nossa obra como se fossemos em palavras o melhor da vida. O problema é que se a vida não é nossa, as palavras ficam apagadas e a história fica-nos a martelar na cabeça como se fosse uma bomba em contra-relógio prestes a explodir.
Eu estou cansada. Mas gostava de ver nos olhos de certos espelhos o cansaço de não serem eles. Chega. Chega de sermos máquinas produzidas em série. Chega de roubarmos as palavras dos outros como roubamos a vida que não é a nossa.
Um dia estaremos presos na jaula que tanto procuramos .. quero ver é quando não der pa sair.

Eu não peço mais do que a ti. Afinal és tu que me apareces no espelho como em qualquer canto da casa, da rua, ou da cidade.








segue os teus passos. 'no mundo dos sonhos podes ser quem tu és. ninguem te leva a mal.'

5 comentários:

TP * disse...

"Ainda te tenho a ti, do outro lado da ponte como quem espera a noiva."

e' mesmo isso que inda nos consegue motivar n é mor? :') olha, a mim não adianta mais nada... estou num profundo nível de saturação. :( " Chega de sermos máquinas produzidas em série." n consigo mais. preciso de descanso. paz e sossego!
mas sei que nessa paz vou-me encontrar com ele. e isso faz-me tão bem e faz-me querer ainda com mais afinco essa paz!

adoro os teus textos, minha pussy! :) leio cada palavrinha ate ao fim! é um crime não ler! :)

beijinhooo * gosto muito de ti! *

TP * disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
S. disse...

Até no cansaço há em ti uma doce e estranha poesia. As palavras arranham-te a garganta e soltam-se como suspiros incontidos falando da verdade da vida que nem sempre é doce. Mas tu és, tu és doce. Nos momentos que partilhas, no amor que suavemente acaricias por entre as feridas do viver. Encanto-me porque és diferente dos outros, não escondes as rugas, nem o olhar sem alento. Não escondes, porque, acima de tudo, não é um olhar vazio. Só cansado... E o cansaço é uma parte da tua autenticidade. Gosto de ti assim, espontanea, verdadeira, inteira.

Beijos

my_wonderwall disse...

muito giro o texto. gostei =)*

Street Fighting Man disse...

muito gostavamos nos d contar a historia toda. pelo contrario ela "fica-nos a martelar na cabeça como se fosse uma bomba em contra-relógio prestes a explodir."

ninguém nasce para ser uma máquina


"rerssurected to be killed
and then maybe born again...
i'll allways be Kezia
as long as any hope remains"

***